Rio de Janeiro

As poderosas do funk

Funkeiras já são idolatradas pelas novas gerações e conquistam espaço em cenário dominado por Anitta, Ludmilla e Valesca Popozuda

Por Nathalia Duarte

Rio - Em um mundo dominado por Anitta, Ludmilla e Valesca Popozuda, novas candidatas despontam nas periferias de Rio e São Paulo para ocupar o cargo de rainha do funk. E elas conquistam espaço nas rádios e serviços de streaming nos últimos anos. Uma mulherada que rouba a cena antes dominada só pelos homens. A MC Rebecca ganhou projeção com o proibidão 'Cai de boca'. Dani Russo está na lista dos brasileiros mais populares no Instagram, com 11 milhões de seguidores. A MC Pocahontas conquistou o seu espaço com o hit 'Perdendo a Linha', que soma 65 milhões de visualizações no YouTube.

Nas suas músicas, elas falam sobre a realidade onde vivem, exaltam a feminilidade e servem de exemplo para milhares de fãs no país. Até Anitta já se rende ao talento delas. "Eu acho incrível que aconteça esse ciclo de renovação. Eu acompanho as meninas e, sempre que possível, eu as convido para cantar comigo, como aconteceu com a Lexa, a Ludmilla... O funk é um movimento lindo, que agrega pessoas e estilos diferentes dentro dele mesmo", diz. Ela acredita que a presença feminina é fundamental para o gênero musical. "Tem que ter mulher, com certeza! É preciso mostrar o nosso poder".

MC Rebecca - Daniel Castelo Branco

Foi o que fez a carioca Rebecca, de apenas 20 anos, quando começou a falar nas suas músicas sobre o direito da mulher de sentir prazer. Ex-passista do Salgueiro, ela ganhou notoriedade depois de gravar o hit 'Cai de Boca', de autoria de Ludmilla. A letra fala sobre a sexualidade feminina. "Eu sempre procuro falar nas minhas músicas o que realmente acontece. Por exemplo, a mulher tem o direito de sentir prazer também. Só em uma mulher estar cantando proibidão e ser reconhecida é algo a ser celebrado”, explica.

Em outubro de 2012, a MC Pocahontas se lançou no mercado com a música 'Mulher do Poder', que falava sobre seus luxos e vaidades. Mas só estourou no gênero nos últimos anos. Com o estilo paulista do funk ostentação, ou o carioca do 150 bpm (batida por minuto), Pocahontas usa sua voz para uma luta muito maior. "O movimento do funk me acolheu e me fez aprender muito. Hoje, trabalhar com minha música me dá voz para falar com outras mulheres sobre assuntos como empoderamento, liberdade e autoaceitação".

Pocahontas acredita que a sua história pode servir de exemplo para outras mulheres. "Posso inspirar pessoas com minha história e com as mensagens que procuro passar ao público. No meu último lançamento, 'Não sou obrigada', por exemplo, eu falo de liberdade e sobre não aceitar atitudes machistas de forma alguma", conta.

Rodolfo Magalhães / Divulgação
MC Pocahontas - Rodolfo Magalhães / Divulgação

Novo estilo que surgiu no Rio

A nova maneira de fazer funk surgiu no Rio de Janeiro. O 150 bpm, de autoria do DJ Polyvox, é uma variação da cadência clássica do funk carioca, composta tradicionalmente por 130 batidas por minuto. O sucesso da batida tomou conta dos bailes funks e fez o Rio voltar a ser um dos protagonistas do gênero musical. Com uma maior liberdade de experimentar gêneros e batidas, as MCs também se arriscam na mistura não só dos bpm, mas também de ritmos diferentes mesclados ao funk.

A paulista Tati Zaqui, de 25 anos, é uma das referências nessa nova tendência. "Quando entrei, ajudei a quebrar muitas barreiras com a minha música. Depois, quando misturei o funk com reggaeton, contribuí muito para que esse ritmo latino tivesse mais abertura no Brasil. Hoje, é algo que todos escutam normalmente. Foi uma grande evolução para o gênero. Meu funk sempre foi assim: misturando outras tendências", conta.

A funkeira ganhou o país após lançar o ritmo 'Parara Tibum', em 2015. Desde então, a cantora de cabelos azuis dominou as paradas de sucesso com 'Água na Boca' e 'Rebelde e Abusada'. E acumula uma legião de mais de 8 milhões de seguidores no Instagram.

Tati Zaqui - Reprodução Instagram

A mistura com o sertanejo

Não ter uma fórmula exata para fazer o funk e sempre estar aberta às novas possibilidades parece ser uma nova receita de sucesso. Após conquistar o posto da maior youtuber feminina do país, com mais de 11 milhões de inscritos no canal, Dani Russo, de 21 anos, decidiu experimentar novos caminhos e encontrou no funk a estrada certa.

"Faço o meu funk de acordo com o que vivo no momento. Não tenho um estilo fixo. Misturo o que ficar legal. Já lancei 150 bpm, funk com sertanejo... As minhas músicas que mais estouraram são as que representam alguma fase da minha vida. Não tem uma fórmula”, conta Dani.

Na luta contra o machismo

Trabalhar em um meio predominantemente masculino gera os famosos casos de machismo direcionado a essas mulheres que tentam ganhar o seu espaço. Mas elas lutam contra as letras de funk que tentam colocá-las em uma posição de submissão. Como resposta, criam músicas de empoderamento.

Mas, mesmo aquelas que são nomes grandes no meio já sofreram ou conhecem alguém que passou por uma situação de constrangimento apenas por serem mulheres nesse cenário musical. "As mulheres sofrem preconceito no meio do funk. Há discriminação, porque algumas músicas falam sobre a sexualização da mulher. A gente está aí para lutar contra isso", explica MC Mirella, de 20 anos, dona do sucesso 'Quer Mais?', em parceria com Pocahontas.

Leo Caldas / Divulgação
Dani Russo - Leo Caldas / Divulgação

Em todos os lugares

Manifestação popular que nasceu nas comunidades, o funk vem cada vez mais tomando conta de todos os cantos da cidade. E, para elas, isso é algo a ser celebrado. "É incrível quanto talento e quanta criatividade sai da favela. O mundo precisa conhecer a fundo isso. As letras escritas pelos MCs retratam o que realmente acontece e o que se passa na favela. É uma pena essa perseguição no funk. Tentam, de todas as formas, criminalizar o ritmo", critica Rebecca. E, quanto mais gente se juntar ao movimento, melhor. "Nós queremos mesmo é poder mostrar que o funk é mundial", completa Dani, dando um recado claro que elas vieram para ficar.

* Colaborou Leonardo Rocha